Histórico

 

  

 

Grupo de Estudos - Patrimônio e memória: casos e descasos.

Algumas reflexões

 

A reconstituição do passado pretende entender o processo histórico e seus agentes por meio de várias ciências, quer as sociais ou as naturais. Entenda-se por reconstrução do passado não a descrição dos fatos em si, mas o que se pensa desses fatos. Esta é uma reflexão que todo o profissional das áreas que trabalham com ciências sociais e humanas deve ter clareza, principalmente em se tratando da aprendizagem direcionada para um público que até então não detinha a prática ou a experiência de conceitos específicos em preservação do patrimônio.
         As descrições isoladas não são dados objetivos ou classificatórios de um período, mas os artefatos dizem muito mais, em uma expressão calada de ser e estar [1]. Ou seja, não basta se descrever os vestígios de algo que se entende por patrimônio material ou imaterial; manifestações culturais e históricas.
 Os artefatos são estruturas de um sistema que funciona conjuntamente entre si e, inclusive, mantém relações, tais como: religiosidade, costumes, gosto, relações pessoais e interpessoais, o lazer, o trabalho, a família. Os objetos não são vestígios em si, mas as sociedades que os produziram os são. Para isso, deve estar implícito durante os estudos acerca de patrimônio e memória que, não raro, tais vestígios do passado, fizeram parte de uma sociedade com valores e hábitos distintos dos da atualidade. Nisto também está sugerido que a nossa sociedade igualmente deixará vestígios para outras que nos sucederão.
A cultura material contribui enormemente para o conhecimento das sociedades, quer através de suas técnicas de confecção, por seu uso ou por sua relação com a organização social. Uma das formas de preservar o patrimônio – e, portanto, o passado – é conhecê-lo e fazer com que sua comunidade o conheça e valorize. A história de uma etnia, por exemplo, é a reconstrução de seu passado, carregada de atualidade, que permite a compreensão de seu presente [2].
Uma vez que o processo se deu para um público que nasceu em uma sociedade impregnada pelo uso da imagem e por valores muito distintos daquele que se está pesquisando, há que se ter a preocupação com os valores ideológicos dados ao produto do conhecimento.
Necessária a harmonia na utilização de conceitos históricos e práticas de educação patrimonial nos objetivos acerca da pesquisa acerca de vestígios e manifestações culturais, uma vez que os conceitos são nossos utensílios intelectuais e as práticas pretendem a busca da compreensão de homens e sociedades. Os últimos serão os meios para se chegar aos primeiros.
Para tanto, neste grupo de estudos de bens patrimoniais intitulado “Patrimônio e memória: caso e descasos” utilizam-se primeiramente, noções básicas sobre patrimônio histórico e memória na construção de um sentimento de identidade e pertença inerentes aos grupos sociais. Nesse sentido, elementar a relação que se deve empreender entre o ensino de história e as transformações pelas quais sofrem as sociedades, tendo sempre claro que a constituição da identidade, seja ela nacional, regional, ou local, passa pela construção da cidadania e da memória coletiva.
No estudo das sociedades primitivas, fundamentalmente, torna-se difícil (senão impossível) a reconstituição do todo, uma vez que há inúmeras possibilidades de fragmentação da realidade social de qualquer grupo humano. Dessa forma, o aluno fatalmente percebe que, nas diferentes sociedades, “o mundo não pode ser nem jamais será compreendido por si mesmo, mas pela capacidade que desenvolvemos de decodificá-lo em suas várias imagens e palavras” [3], levando-o assim, a indagar-se sobre sua própria identidade e a que grupo social pertence. Ou seja, quais suas estruturas sociais de família, religião, hábitos, costumes, festividades, relações pedagógicas. Enfim, que ao indivíduo compreenda enquanto pertencente a um grupo social e, portanto, cidadão da polis. Esta consciência, posteriormente, lhe dará a noção de nacionalidade e, por conseguinte, a percepção de cidadão brasileiro, por exemplo.
Cônscio do pertencimento e da cidadania, este indivíduo desenvolverá, inevitavelmente, a necessidade da preservação do patrimônio histórico do qual faz parte e do patrimônio histórico de civilizações pretéritas.
Mas, afinal, o que é patrimônio? Embora haja controvérsias, a palavra sugere pater, que, por conseguinte, lembra pai e, portanto, herança. Sendo ele (o indivíduo) herdeiro do patrimônio, que também é do Estado, isso lhe traz o vínculo com a nação e, portanto, com a pátria. Desenvolvendo esses conceitos, se delimita, concomitantemente, o conhecimento e assimilação de elementos básicos no processo de ensino-aprendizagem: a importância da preservação do patrimônio histórico, a construção da cidadania e a valorização da memória na reconstituição da história.
A nossa relação com a história está em permanente evolução e isso quer dizer que a visão que temos de determinado fato hoje, não necessariamente será a mesma visão que teremos no futuro. Isso também quer dizer que durante todo o processo de aprendizagem, as pessoas modificam e aprimoram seus conceitos e sua percepção de mundo, tanto quanto um determinado fato histórico não obteve fator tão relevante, quanto suas implicações na formação de algumas pessoas.
Provocar a curiosidade para estimular as pessoas na busca do conhecimento e da pesquisa, tem sido a alavanca inicial no deste grupo de estudos. O resultado decorrente dessa consciência, com relação ao entendimento da preservação do patrimônio público, da construção da cidadania e do sentimento de pertença, é a constatação de que, enquanto educadores e indivíduos em sociedade, não se deve ficar atrelados somente à sala de aula, tampouco presos unicamente aos conteúdos pré-estabelecidos. É preciso também ousar.
A produção do conhecimento, a constituição da cidadania e o cuidado com o patrimônio material ou imaterial são práticas que devem ser exercidas continuamente. O exercício de provocar o desejo pela busca da compreensão intelectual da humanidade aos jovens, deve fazer parte do cotidiano das instituições de ensino.  
Isto posto, justifica-se a criação desse grupo de estudos, em 22 de dezembro de 2009, sendo seus componentes iniciais os acadêmicos:
1. ANE CAROLINE SILVEIRA DE OLIVEIRA
2. ANGÉLICA MEDIANEIRA ROSO ROSTAND
3. DAIANE SILVEIRA ROSSI
4. DANIELA SILVEIRA
5. GLAUCIA DA ROSA DO AMARAL
6. IVONE DE FREITAS FELTRIN
7. JULIANA MARIA MANFIO
8. RENATO SILVA CRUZ
9. TAMIRIS CARVALHO.

Profª. Roselâine Casanova Corrêa
Especialista em Museologia e Ensino (UNIFRA); Mestre em História (PUC\RS).



[1] KERN, Arno. O papel das teorias como instrumental heurístico para a reconstituição do passado. Revista Histórica. PUC/RS. POA, Vol. I, 1996, p. 7-22.
[2] BENJAMIN, Walter. Teses sobre a filosofia da história. In: KOTHE, Flávio (org.). Sociologia. São Paulo: Ática, 1991.
[3] GARBINATO, Valeska. Ensino de história e patrimônio histórico: pontes para a construção da memória e cidadania. IN: Revista da Faculdade Porto-Alegrense de Educação, Ciências e Letras. Educação e patrimônio histórico-cultural. Porto Alegre: Faculdade Porto-Alegrense de Educação, Ciências e Letras, 1979. Semestral. Irregular de 1979 a 1983. Semestral de 1985 a 1987. Anual de 1988 a 1995. Irregular de 1996 a 1998. p. 41.